30.6.08

Fin de séjour, rumo a Campinas

Acima, nosso ônibus de volta pra Campinas! Com ele, deixamos esse blog depois de muitas notas publicadas com vários dias de atraso. Também de notas imaginadas e jamais escritas, sobre uma representação de La Megère aprivoisée tão impressionante de Oskaras Korsunovas, sobre as casas de Ramón ou a zarzuela La leyenda del beso, sobre queijos, brioches, palmiers, croissants e restaurantes que arriscamos aqui e acolá, com mais ou menos sorte. Sobre os amigos que ficarão aqui, do outro lado do atlântico. Mas ainda nos restam alguns dias de viagem, um pouquinho de Portugal: Lisboa, Sintra, Porto, cujas fotos estarão no flickr e cujas histórias serão contadas pessoalmente. Com um "até logo" a familiares, também a amigos (uma parte deles reencontrados através do blog) e a misteriosos e por vezes fiéis leitores anônimos.

Livia e Pablo.

Pirandello

O entusiasmo pelo filme A dupla vida de Mattia Pascal de Mario Monicelli (1985), inspirado pela novela de Luigi Pirandello, com Marcelo Mastroianni no papel principal (acima), nos levou a assistir mais recentemente a Seis personagens em busca de um autor, montada pelo simpático, improvisado e infernalmente quente Teatro do Nord-Ouest. Trata-se de um ensaio teatral invadido por seis verdadeiros personagens, que procuram alguém que conte a sua história. Na montagem, sem tanta direção talvez por ironia, a passagem apenas sutil do registro ficcional à ficção de verdade não produziu todos os efeitos que o texto, tão belo, parece revelar.

O filme de Monicelli foi recentemente lançando em sua versão integral em dvd no Brasil. Previsto para a televisão, no cinema é reduzido em pelo menos 1 hora.

29.6.08

Só o fim do mundo

Louis (Pierre Louis-Calixte, acima), trinta e quatro anos, está prestes a morrer. Sem saber exatamente o porquê, decide rever sua família depois de longos anos sem contato, a não ser pelos cartões postais. Pretende anunciar sua morte. Em vez disso, no entanto, desperta um turbilhão de rancores adormecidos, de antigas cóleras, de histórias mal resolvidas, de fantasmas. Com exceção dele, todos falam, procurando preencher os silêncios: sua mãe (Catherine Ferran), seu irmão (Laurent Stocker), sua cunhada Catherine (Elsa Lepoivre), sua irmã (Julie Sicard). Essa história, chamada Juste la fin du monde, poderia ser a de muitos, como é, parcialmente, a do próprio autor, Jean-Luc Lagarce (1957-1995). Acaba de entrar no repertório da Comédie Française, com estréia dirigida por Michel Raskine. Pouca ação e um discurso poderoso. Ao não dizer o essencial, ecoa culpa, dor e, portanto, incomoda. O silêncio, entretanto, não impede que Louis selecione os momentos daquela visita capazes de dizer a sua verdade, com irônicos cortes sonoros que parecem cliques de máquina reflex.

Segundo o Ministério da Cultura, as peças de Lagarce estão entre as mais representadas na França depois de Shakespeare e Molière. Tudo caminha para torná-lo um clássico, Juste la fin du monde e Nous, les héros são parte do programa do “baccalauréat théâtre” 2007-2008. O primeiro link contém uma ótima entrevista com o ator principal.

Saint Denis

Se em Paris a população imigrante movimenta a cidade economicamente, embora bem escondida (para de fato ver esses homens e mulheres é preciso pegar o metrô às 5 da manhã, num dos primeiros horários, ou os ônibus noturnos, depois que o metrô deixa de funcionar), no centro de Saint-Denis eles estão por toda parte, vestidos de acordo com os costumes de seu país. Fomos até lá para ver a basílica e catedral, com seus grandes vitrais filtrando luzes coloridas. Símbolo de poder econômico, e sobretudo real desde a Idade Média. Lá estão os restos mortais de vários reis, rainhas, príncipes, princesas e homens estreitamente ligados à nobreza. Uma vez certos de que Saint-Denis caíra naquele lugar, depois de decapitado em Montmartre, todos (os que podiam) quiseram estar ao lado do santo e partilhar um pedacinho do céu. São, portanto, várias estátuas jacentes (elaboradas para guardar o corpo inteiro, as entranhas ou apenas o coração), monumentos funerários gigantescos e túmulos (em pedra, mármores variados, metálicos). Entre os grandes ali sepultados estão Carlos V o sábio, Luís XVI, Maria Antoanete, Henrique II, Catarina de Médici e o meu predileto, Pepino o breve!

Château de Versailles

Ontem, a companhia de amigos nos fez passar o dia em Versailles. Último final de semana, um pouco de sol. O conhecido castelo está a trinta minutos de Paris. Somado aos jardins, ao Grand Trianon e ao Hameau de la Reine, dois outros conjuntos de prédios e áreas verdes, é um bom convite a um dia de ócio. Pelo preço, no entanto, sabendo das ofertas de espetáculos em Paris e mesmo dos apartamentos reais decorados, como os de Napoleão no Louvre, sempre vazios de turistas, é possível voltar relativamente decepcionado. O tal do grande show de águas, que começa agora no verão, nada mais é do que as fontes funcionando normalmente, com altofalantes tocando música barroca e simulando ruídos à la George Lucas. Mas há vários lugares pitorescos: a grande sala de vidros, o quarto dourado do rei sol, uma cidadezinha de interior construída em torno de um lago, aldeia da Marie Antoinette, uma fazenda, o grande canal em forma de cruz. Bom mesmo, contudo, para fazer um pique-nique e vislumbrar o erotismo por vezes indiscreto das fontes de água.

28.6.08

Melancholia de George Friedrich Haas

A Ópera de Paris começou a montar há alguns dias no Palais Garnier a inédita Melancholia de George Friedrich Haas, compositor norueguês nascido em 1953. Inspirado pela vida do pintor Lars Hertevig, conforme relatada pelo romance de Jon Fosse, encheu de música maravilhosamente moderna uma história simples, bem simples, talvez até um pouco tola. A direção musical de Emilo Pomarico, ótimos cantores (Otto Katzameier e Melanie Walz), belo cenário minimalista de Stanislas Nordey e o Klangforum de Viena ajudaram a manter a impressão de seriedade. Garantiram, com isso, o entusiasmo do público de ontem.

27.6.08

A Cartoucherie de Vincennes era uma fábrica de armamentos e estava abandonada. Nos anos 70, o conjunto de armazéns, em vias de demolição, passou a ser ocupado, primeiro pelo Théâtre du Soleil, depois por outras companhias, como o Théâtre de la Tempête, de l'Aquarium, de l'Epée de Bois e o Théâtre du Chaudron. Na zona 3 de Paris, o lugar é especialmente campestre, no meio do atual Parc Floral (antes também propriedade do exército). Isso não impede, entretanto, que Shakespeare seja ali representado. Em Penas de amor perdidas, tudo é artifício e explosão para concretizar sonhos e prazeres ingenuamente proibidos pelo rei de Navarra e seus amigos, antes engajados numa abstinência de três anos destinada ao conhecimento e ao estudo. A adaptação é de Ariane Bégoin, a direção de Hélène Cinque e a coreografia de Marie Barbotin. Espetáculo de muitas risadas, com dança, pantomima, canto e clowns. Também muita cultura pop, empregada às mil maravilhas para atualizar a peça: de Aznavour a Mika, passando por hits americanos e filmes como Sex and city e Tigre e o dragão. Destaque para os papéis farsescos de David Levadoux (Don Adriano de Armado, acima, à esquerda, no cartarz da temporada anterior) e Nicolas Vallet (Courge, à direita), além da graciosa canção de Jacquinette interpretada por Julie Autissier.

Dica para tornar o passeio ainda mais agradável: indo ao Théâtre du Soleil (o único que chegamos a conhecer), aproveite para jantar. Tudo bom e barato, em meio a budas vermelhos e velas, num ambiente verdadeiramente decontracté/relax.

23.6.08

Mecenas e benfeitores, a propósito do Marmottan

Que seriam dos museus franceses sem as doações e os mecenas? É o que nos perguntamos diante do Musée Marmottan Monet de Paris. No Brasil, certamente gostaríamos de suspirar assim, mas o panorama é outro, bem distante, e falamos dos roubos e da falta de dinheiro do MASP, da Pinacoteca de São Paulo, do Museu do Ipiranga e do Museu da Chácara do Céu. Todo o acervo do Marmottan, desde o legado de móveis e bronzes napolitanos e dos documentos históricos da família Marmottan, passando pelos quadros impressionistas colecionados por Georges de Bellio (médico de Manet, Monet, Pisarro, Sisley e Renoir), também pelos quadros herdados pelo filho de Monet, Michel - foram generosamente doados. Depois ainda vieram as obras reunidas por Henri Duhem e sua esposa Mary Sergeant, por Denis e Annie Rouart (Berthe Morisot, Manet, Degas, Renoir e Henri Rouart), além das iluminuras dos séculos XIII ao XVII da família Wildenstein. Um espaço inteiro é dedicado a Claude Monet, o que faz a delícia dos que se encontram com traços, cores e paisagens incrivelmente livres, antes mesmo das vanguardas do século XX (acima La Barque, óleo sobre tela de 1887).

Alguns hotéis em Paris

Já quase fechando as malas, mas pensando num possível retorno, guardamos, antes de revender nossos guias de Paris, alguns endereços de hotéis simpáticos com preços razoáveis. Talvez por isso, a maior parte sem endereços na internet. De todo modo, é sempre melhor dividi-los.

No 1er: Hôtel Henri-IV (25, pl. Dauphine, 01-43-54-44-53, M. Cité, Châtelet, Pont-Neuf, 40-72€).

No 9ème: Hôtel Le Rotary (4, rue de Vintimille, 01-48-74-26-39, M. Place de Clichy, Saint Lazare, 47-54€).

No 10ème: Hôtel du Marché (6, passage du Marché, 01-42-06-44-53, hoteldumarche @netcourrier.com, M. Château-d'Eau, Jacques-Bonsergent, niveu du 62 du Faubourg Saint-Martin, 43-56€), Hôtel Palace (9, rue Bouchardon, 01-40-40-09-45, palace-hotel@club-internet.fr, M. Strasbourg-Saint-Denis, Jacques-Bonsergent, 25-38€), Hôtel Marclau (78, rue du Faubourg-Poissonière), 01-47-70-73-50, hotelmarclau.com, M. Poissonière, Bonne-Nouvelle, 33-39€), Hôtel du Brabant (18, rue des Petits-Hôtels), 01-47-70-12-32, reservation@hotel-brabant.com, hotel-brabant.com, M. Gare-du-Nord, Gare de-l'Est, 40-52€), Hôtel Moderne du Temple (3, rue d'Aix, 01-42-08-09-04, reception@hotelmoderne.dutemple.com, hotelmodernedutemple.com, M. Goncourt, 40-53€).

No 11ème: Hôtel de Vienne (43, rue de Malte, 01-48-05-44-42, hoteldevienne@aol.com, hoteldevienne.com, M. Oberkampf, République, 38-57€), Hôtel Printania (16, bd du Temple, 01-47-00-33-46, M. République, Filles-du-Calvaire, 37-54€).

No 14ème: Hôtel des Voyageurs (22, rue Boulard, 01-43-21-08-20, hotel.des. voyageurs2@wanadoo.fr, hoteldesvoyageursparis.com, M./RER B Denfert-Rochereau, 50€.)

22.6.08

Cyrano de Bergerac

No próximo dia 26 de julho, a famosa peça de Edmond Rostand terá sido encenada mil vezes na Comédie Française. É, portanto, dentro de uma tradição assombrosa que se inscreve a atual direção de Denis Podalydès. Nenhum palpite poderia tornar melhor a representação. Cada cena parece o resultado de centenas de homens que durante mais de um século imaginaram as melhores combinações para iluminar, ambientar, vestir, coreografar, esgrimir e atuar. E no entanto, com que naturalidade tudo é realizado, um pouco como se não houvesse outra maneira! A montagem ganhou nada menos que 6 Molières (direção de Podalydès, decoração e cenário de Éric Ruf, figurino de Christian Lacroix, iluminação de Stéphanie Daniel, de novo Éric Ruf como ator coadjuvante e Molière do teatro público). Estranho que na lista não esteja Michel Vuillermoz, a encarnação mesma de Bergerac (acima).